terça-feira, 29 de março de 2016

Brasil líquido

Já não se batem panelas mais. 

Não é preciso. 

O objetivo de derrubar o governo eleito através de um constitucional (sim) e questionável (também) processo de impeachment caminha na cadência que pede o cortejo de uma nação. A derrota não é de um individuo ou grupo, mas de um país inteiro.

Derrubar um governo no seu segundo ano de mandato é sinal de fracasso. Seja pelo equívoco da escolha feita seja pela falta de alternativas menos traumáticas para a economia e para a política que pudessem tornar um governo viável.

A solução segue as tendências da modernidade líquida de Baumann e outros pensadores onde substituir é mais fácil do que consertar. A regra, achava eu, valia para coisas, pessoas, amores talvez. Destinos de nações me parece demais agora.

O precedente está aberto.

"Compramos" a queda de Dilma como quem troca de celular que no fim das contas, vai fazer mais do mesmo. A "prateleira" tinha poucas opções o que na minha modesta visão fazia da opção pela manuntenção uma boa. Mas a questão não é essa. É preciso comprar a "mudança".

Nos meios que frequento, dizer que é contra a saída de Dilma gera reações de espanto similares às de dizer que não tem, por exemplo, um smartphone nos dias de hoje. 

Bastou a Temer (que fez parte de tudo de errado deste governo) e ao PMDB esperar. A obsolescência programada deste governo já estava configurada desde a divulgação do resultado do pleito de 2014. Era só aguardar uma novidade no "mercado". 

E ela veio do Paraná.

Como qualquer produto, tudo começou com a matéria prima que veio de Curitiba. Matéria prima de qualidade e que espero virar algo realmente bom pro país.

O problema é que o produto final preferido acabou sendo montado pelos setores da imprensa que tem tradição pela defesa de interesses não-coletivos e acostumados em vender "coisas".

Assim, lapidado por profissionais o produto acabado estava pronto para um mercado sedento de "impeachmaníacos".

Dormimos na porta da loja, brigamos pra ter, discriminamos quem não comprou, não temos como viver sem.

Porém, como de costume, não lemos direito o manual de instruções que no nosso caso é conhecida pelo nome constituição.

Também me parece que esquecemos que é preciso pagar por essa compra. 

Neste caso o pagamento à vista nunca é uma opção e a compra no crédito parece longs demais e vai comprometer as "compras essenciais" do futuro.

O Brasil não vai mudar. Este produto não está e nunca esteve disponível no mercado.




domingo, 13 de março de 2016

Polarizados?

São 2:40 da manhã de mais um dia que entrará para a história do Brasil.

Ao que tudo indica, milhares de pessoas vão às ruas na tarde de hoje pedir, entre outras coisas, o impeachment da presidente reeleita Dilma Roussef.

Os ânimos estão cada vez mais acirrados numa polarização inventada dos discursos contra e em favor da atual liderança do executivo.

Digo inventada pois só é possível definir uma divisão em pólos quando há maneiras objetivas de se dividir as partes envolvidas e esse não parece ser o caso.

Listando as seguintes características:

-Não tolera a opinião contrária.
-Faz vista grossa para alguns personagens políticos atolados em denúncias de corrupção.
-Acha que aqueles que pensam de maneira contrária querem beneficiar um grupo em detrimento do todo.
-Acha que o suposto outro lado odeia rico/pobre.
-Compartilha conteúdo de fontes duvidosas nas redes sociais.

Postas as características acima, de quem falamos?

Pois é, pensou em coxinha/mortadela. Errou. Esse aí é você!

Mas calma que a culpa disso não é sua, nem minha, nem do outro, mas de todos nós.

A polarização inventada e colocada no nosso inconsciente coletivo pelos meios de comunicação formadores de opinião beneficia quem a não ser os próprios meios de comunicação formadores de opinião? E quem perde?

Certamente todos.

Caberia a cada um de nós ter a visão crítica necessária para entender que fatos não são informados de maneira isenta nunca. O professor Leandro Karnal escreveu em um dos seus posts no Facebook sobre o que faz diferença para formar um espírito crítico e nele sugere algumas leituras:

[...]
Exemplo inicial: Bíblia. Livro formador do pensamento ocidental. Sem ela  quase nada faz muito sentido, da Capela  Sistina ao Caim de Saramago. Não é religioso? Aprenda que o seu gosto é irrelevante na formação do mundo ocidental. Tem ojeriza a textos religiosos? Vc será pó e a Bíblia continuará a ter muita influência no mundo mil anos depois que seu sobrenome tiver virado fumaça nas brumas do tempo. Formação não é preferir coca zero com gelo ou só limão . Formação é processo de diálogo denso e árduo com as bases do mundo.
[...]

Talvez o que eu esteja fazendo vá na direção contrária ao que sugere o professor Karnal uma vez que meu embasamento não é tão sólido e parte de simples observação do mundo ao meu redor. Entretanto penso que vivemos uma crise do espírito crítico/formação por ele definidos uma vez que achamos que só a nossa interpretação dos fatos é relevante.

Blindar-se de qualquer discurso que não seja uníssono com o meu tiraria a solidez que essa posição deve transparecer ao olhar do outro.

É muito provável que durante este dia o universo seja dividido em Quem-foi e Quem-não-foi e que esta classificação torne-se condição inequívoca para que sua opinião seja sumariamente ignorada e/ou ridicularizada pelo dito "outro lado".

Paradoxalmente quanto mais aceitamos a imposição dessa divisão, mais parecidos nos tornamos.