sexta-feira, 5 de agosto de 2016

Vão-se os anéis, ficam os dedos

Rementendo às superstições que acreditam trazer prosperidade e sucesso, em 08 de Agosto de 2008, pontualmente às 20:08 os chineses apresentavam aos outros 5/6 do mundo a China que é potência econômica, política e, claro, esportiva. Muitos, como eu, interpretaram a abertura épica e a organização daqueles jogos olímpicos como o credenciamento final do gigante asiático ao restrito hall de países desenvolvidos.

Naquele mesmo ano, do outro lado desta bola rochosa perdida no espaço, um outro gigante brilhava como nunca antes e se posicionava como o sucessor natural ao acesso desse mesmo hall. Senti que o próximo da fila, se é que ela existe, finalmente seriamos nós.

Enquanto os membros do mundo desenvolvido do qual sempre quisemos fazer parte pareciam saltar sincronizadamente na crise financeira que atingia a economia global, por aqui a euforia era total e, segundo algumas figuras públicas notáveis, só uma marolinha da onda da crise chegaria por aqui.

Assim como Ícaro (ah sempre os gregos) nossas asas de cera e mel estavam deslumbrantemente prontas para alçar vôo. Nosso Sol: os Jogos Olímpicos de 2016.

Oito anos se passaram...

A marola ganhou força ao aproximar-se da rasa costa brasileira e, se nos países menos "abençoados por Deus" terremotos são seguidos de tsunami, por aqui ocorreu o contrário: o tsunami econômico foi seguido por um terremoto político.

Se intepretado semanticamente teríamos um incalculável estrago, o sentido figurado dessas catástrofes não fica atrás.

Sobrou pouco daquele Brasil de 2008 (nem as figuras notáveis se salvaram) e nossas asas de Ícaro parecem mais perto que nunca de derreter no calor do implacável Sol Tropical que nos seduzia há oito anos.

É muito provável que os jogos do Rio sejam lembrados pela quantidade de problemas antes e durante as disputas...

-Mas é sempre assim...- alguns dizem.

Dúvido muito que britânicos, chineses, gregos, australianos e americanos que organizaram os últimos jogos estariam aptos a usar argumento tão fajuto que com frequência "cola" por aqui.

Alguns se basearão no velho costume brasileiro de minimizar os problemas ignorando críticas e achando que o já consagrado jeitinho vai fazer as "coisas acontecerem" na hora que precisar e o "espírito festivo" tupiniquim criará uma atmosfera festiva com o (suposto) sucesso que foi a Copa de 2015.

Outros tão pouco realistas quanto os primeiros dirão que tudo foi um desastre. Exaltarão a incompetência inata deste povo fadado ao atraso, condenado à sua pequenez histórica. Às vezes tenho a impressão que diminuir quaisquer manifestações de esforço coletivo é por aqui equivocadamente interpretado como sinônimo de lucidez.

O conflito de opiniões e expectativas ficou claro quando o presidente do COI Thomas Bach disse que esse seria um evento "À la Brasil".

-O que será que ele quis dizer?

Para não expor demais o cômite local, e evitar mais polêmicas nos já complicados jogos do Rio, Bach esclareceu que quis exaltar o clima festivo do povo local.

Postos fatos e (mais) opiniões, a conclusão que chego é a de que ainda somos como o Ícaro preso no labirinto de Minos, seguimos perdidos e sem asas mas de alguma maneira mais cientes de que asas de cera não são as melhores para alçar o vôo que nos levará ao objetivo desejado.

Portanto, se o filho de Dédalo não teve a chance de ter um final de melhor sorte, o Brasil poderá de hoje em diante trabalhar em "asas melhores" sabendo que alcançar o tão desejado lugar ao Sol (não somente olímpico) é tarefa que demanda tempo, amadurecimento e, fundamentalmente, mudanças culturais fortes, ou seja, um labirinto muito mais sinuoso e cheio de rotas falsas que o análogo do mito grego.

Se a frustração é grande nesse momento é preciso lembrar que apesar de tudo o velho provérbio, em versão adaptada, nos dá um consolo com fundo de esperança:

Vão-se os anéis, olímpicos, mas ficam os dedos.

Portanto, declaro aberta a busca por um destino melhor pra todos nós.