segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Brasil e o sonho olímpico

Hoje, 06 de agosto de 2012, em Londres, Arthur Zanetti (anônimo até então) tornou-se o primeiro brasileiro a conquistar uma medalha na ginástica artística. Um feito memorável ainda mais tratando-se do Brasil que não possuía tradição no esporte.

Diz-se que no Brasil os atletas são muito cobrados por resultados excepcionais que podem se resumir em ser sempre o primeiro (Rubinho que o diga). Em rodas de conversa é comum depararmos com comentários do tipo: "Foi bem, mas ganhou prata" ou "Nem chegou na final". 

Quando o assunto é o quadro de medalhas é que os comentários descem a ladeira do respeito, principalmente aos outros povos: " Estamos atrás do Cazaquistão!!", "Estamos atrás da Etiópia, não é lá que eles passam fome?". Só para esclarecimento, estamos sim atrás do Cazaquistão simplesmente porque esse país fez parte da União Soviética e ainda colhe(e semeia) frutos de esportes tradicionais no país, geralmente lutas. Sobre a Etiópia, prefiro deixar que cada um chegue a sua própria conclusão sobre um comentário do tipo que transcrevi acima. Todas essas comparações só desmerecem os outros países que com mais ou menos dificuldades competem e conquistam suas medalhas.

O motivo deste post na verdade está na cobrança que os atletas brasileiros têm que enfrentar por parte da população em geral. A mídia, sempre bastante hipócrita, adora mostrar compaixão aos "perdedores" exaltando o espirito Olímpico, mas na verdade só valoriza mesmo quem chega lá, considerando que chegar lá não é estar em Londres competindo, mas sim ocupar o lugar mais alto do pódio.

No fim de semana passado o desempenho (e expressão) do nadador César Cielo foi o retrato da cobrança por parte de mídia e o seu rebanho conhecido também pelo nome povo. A manchete abaixo é a síntese disso tudo:


Certamente esperando manchetes do tipo Cielo declarou logo após a final: 




"Não gostei da minha prova. Sinceramente, achei que podia ter feito melhor, se não tivesse nadado os 100 livre. Estou me sentindo um pouco cansado hoje, então acabou prejudicando um pouquinho, mas dei tudo o que eu tinha que dar, fiz o meu melhor, agora é pensar no futuro"





A pressão que fazemos por resultados excepcionais é uma tremenda injustiça com esses atletas. Primeiro porque a maior parte deles recebeu pouco ou nenhum incentivo por parte do governo que deveria fomentar essas atividades. Está na Constituição (sic). 

"Art. 217. É dever do Estado fomentar práticas desportivas formais e não-formais, como direito de cada um [...]"

Já a realidade é a que vemos em notícias como a abaixo...


O ciclista sem uniforme reserva pode ainda ser considerado um sortudo por ter o primeiro (rasgado) uniforme.

Apesar de tudo, tais fatos me fizeram, relutantemente, concluir que a cobrança que existe sobre os atletas pode até não ser justa, mas é legítima uma vez que ela nasce nos próprios atletas e nos "contamina". Todos eles passaram dificuldades inimagináveis pra mim e provavelmente pra você que lê isso. Os obstáculos vão desde falta de aparelhagem de ponta até coisas básicas como uma refeição (afinal não é só na Etiópia que pessoas passam fome). E por todos esses percalços, a glória do primeiro lugar é o único resultado que faz toda a luta ter valido a pena. E nós, os compatriotas desses guerreiros, sabendo das dificuldades enfrentadas por esses caras torcemos incondicionalmente caindo na desgraça de passar do ponto exigindo somente o impossível ou improvável terminando por desvalorizar méritos abaixo do esperado, a começar pelo 2o lugar. O brasileiro não precisa aprender a perder, mas saber para quem perdeu. E em geral, perdemos para nós mesmos quando não damos os incentivos devidos àqueles que merecem.

Termino este post com uma frase dita em 1994 (seis anos antes de falecer) pelo goleiro Barbosa da seleção brasileira vice-campeã mundial da Copa de 1950:



"Neste país, a pena máxima criminal é de 30 anos. Não sou criminoso e já cumpri dez anos a mais do que isso. Tenho o direito de dormir tranqüilo"





2 comentários:

  1. só para corroborar com tudo oq vc disse, taí uma enquete...

    http://www.terra.com.br/esportes/jogos-olimpicos/infograficos/decepcao-em-londres/

    pelo menos dá pra ver pelos comentarios que mais gente pensa igual!

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  2. O mundo é mto competitivo e nós mesmos somos julgados e rebaixados toda vez que não chegamos em primeiro lugar, seja na escola, faculdade, trabalho, salário, etc. A crueldade é imperativa em todos os ambitos da sociedade.

    Sinto muito pelos atletas, que nunca tem seu esforço reconhecido de verdade e saem com aquele gosto amargo na boca, de decepção e derrota, pois não tem nem a oportunidade de sofrer ou comemorar seu feito, pois tem mtos outros jogando na cara sua "decepção" e derrota. - Muitas vezes eles gostariam de comemorar seu 3º ou 4º, quem sabe 10º lugar, afinal, sem verbas e comendo miojo feito com a água do chuveiro, chegar em 7º poderia ser uma alegria, ou mesmo tendo todo o patrocínio e treino, chegar em 3º pode ser uma alegria, pois quantos outros também treinaram, se esforçaram e se superaram... mas, não aqui e acredito que não em muitos lugares do mundo. Uma pena, uma injustiça, mas uma realidade difícil de modificar, estão muitas ovelhas no caminho do pastor (mídia, politicagem, etc) e tirá-las de lá, de seu olhar em transe para a alienação, é muito complicado.

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